terça-feira, 26 de abril de 2011

Baixada Fluminense: das trilhas aos trilhos

            Na primeira metade do século XIX, o mundo assistia maravilhado ao desenrolar da Revolução Industrial que entrava então em sua segunda fase. Enquanto a primeira, iniciada em 1782, teve como eixo principal o crescimento da indústria têxtil, notadamente pelo desenvolvimento do motor rotativo por James Watt, este segundo momento verá a grande revolução dos meios de transporte, cujo primeiro marco significativo será a locomotiva a vapor de Richard Trevithick, em 1804.
            Os ecos do progresso que impressionava a Europa chegam às Américas e encontram em Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, seu principal incentivador em terras brasileiras, fundando a primeira ferrovia que ligava o Porto Mauá (mais tarde Estação da Guia de Copaíba) a Fragoso e Inhomirim, no pé da Serra da Estrela, num percurso total de 15,5Km.
            O pioneirismo de Mauá seria fundamental para a grande transformação ocorrida na geografia urbana da Baixada Fluminense ao longo da 2ª metade daquele século.
            Ao observarem a eficácia do trem de ferro no transporte de carga e de pessoas, outros empresários passam a investir no desenvolvimento ferroviário. A fim de não me alongar pormenorizando a totalidade da história das vias férreas cariocas, detenho-me nos aspectos q eu ligam mais diretamente esta história ao processo de desenvolvimento da Baixada Fluminense.
            Em 1858, a Estrada de Ferro Pedro II (hoje Central do Brasil) chegava a Maxambomba (hoje Nova Iguaçu), Queimados e Japeri, regiões conhecidas à época pela produção de café e mais tarde de cítricos.
            Havendo a necessidade de abastecimento de água para a cidade do Rio de Janeiro, opta-se pelo transporte ferroviário para levar os materiais necessários à canalização de água da Represa Rio D’Ouro à capital. Em 1876 começa a construção da Estrada de Ferro Rio D’Ouro, que até 1883 limitou-se ao transporte de carga, quando então, e em caráter provisório, passou a executar serviços diários de passageiros.
            Em 1882, a The Rio de Janeiro Northern Railway Company concede a Alípio Luis Pereira da Silva a concessão para uma estrada de ferro que ligaria a cidade do Rio de Janeiro diretamente a Petrópolis. Estava criada a Estrada de Ferro Leopoldina Railway que, no dia 28 de fevereiro de 1884, iniciava o trabalho de assentamento dos trilhos que chegariam, no dia 23 de abril de 1886, a Meriti, hoje Duque de Caxias.
            Sem nos determos mais em datas e fatos históricos, é de grande relevância entender o impacto causado pela implantação das estradas de ferro na Baixada Fluminense. A região, cortada por trilhas fluviais que escoavam seus produtos e ao mesmo tempo por irregulares trilhas de terra que atravessavam montes e matas, podia tornar-se inalcançável com a menor chuva. Com a chegada dos trilhos do progresso, tal situação se altera sobremaneira.
            A locomotiva passa a ser a melhor opção de transporte tanto de passageiros quanto de carga, seja pelas ferrovias principais, seja por outras menores que surgiram e com aquelas fizeram ligações.
            Em um movimento natural de deslocamento demográfico, o entorno das ferrovias passa a receber a população que antes se encontrava isolada nas matas ou nas áreas ribeirinhas e que passa a ocupar toda a extensão das vias férreas, com especial concentração junto às paradas dos trens, onde havia fácil acesso à água, lenha e outras utilidades. O comércio cresce em torno destas paradas, muitas delas se tornando embriões de importantes cidades como Nova Iguaçu e Nilópolis, só para citar algumas.
            Toda a expansão urbana da Baixada Fluminense está intimamente ligada à expansão ferroviária, com ecos inclusive no tipo de produção agrícola e no posterior loteamento de antigas fazendas da região.
            Mais tarde, com a decadência econômica da região, decadência esta apressada pelo assoreamento dos rios causado pelo desmatamento, as febres palustres e o fim da escravidão, a população local se viu forçada a busca sua subsistência em outras regiões. Mais uma vez as ferrovias surgem como protagonistas neste novo movimento que permanece até os nossos dias e que levará à Capital do estado, junto com a força de trabalho, a cultura e os valores da região.
            Mas isso já é outra história...

terça-feira, 19 de abril de 2011

Simbiose

Não te quero nem te gosto,
mas te preciso o tempo todo.
Tua existência me irrita,
me desagrada, me aborrece,
me completa, me auxilia.
Quero me livrar de você
a toda hora
e toda hora
te busco, te trago
e não te deixo.
Quando estás diante
de meus olhos
só faço recordar
o aborrecimento que me causas.
Quando te largo
não posso ter
o prazer maior
nem consigo entender
o que se passa
à minha volta.
Na rua não te exibo
para que não me deixes
constrangido.
Passo o dia sem você,
te esqueço, te abandono, te traio.
Em casa, te procuro na cama
para alguns momentos de prazer;
te uso até cair no sono
e percebo que
te usando te pertenço;
não sou livre
não sou dono
não sou meu.
Sou teu escravo
e dependente,
maldito óculos.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Por escolha

Para Lia Mariah
Veio chegando de mansinho
Sem pedir licença
Sem prender o riso

Com olhos moventes
Atentos pra tudo
Cavando espaços
Enchendo vazios.

Na ponta dos pés
Por um caminho
De flores e estrelas
Recolhe conchinhas,
Cavalga as ondas
E de cada vez
Espalha encanto.

Aqui e
Ali a felicidade...

Ah! Menina danada,
Moleca sapeca,
Quem me dera fazer
Teus sons barulhosos
A canção de ninar
Pra sonhar cintilante
Em meu dormir lá da frente...

Mas me acorda criança
E com a cor da esperança
Vem brincar cirandinha.
Desperta boneca,
Meu coração-peteca
Joga de um pra outro lado.
Vem fazer arruaça,
Vem subir no telhado,
Vem comer fruta-manga do pé
E com as mãos bem juntinhas
Numa prece de risos
Vem fazer par comigo
Faz crescer minha fé

E nas tardes-preguiça
Te embalo em um canto
Bom demais de cantar
A olhar carneiros-nuvens
Correndo no azul...

terça-feira, 5 de abril de 2011

Procura

Onde estão meus poemas?
Já olhei em todos os cantos,
Vasculhei meus recantos
E não acho um verso sequer.
Onde os terei deixado?
Em que curva de estrada
Esqueci meus versos brancos petrificados?
Por certo ficaram em alguma encruzilhada
Ou embaixo de alguma pedra no meio do caminho.
É possível que uma Nega Fulô
Os tenha levado
Para depô-los aos pés
De um Orfeu reinventado,
Ou então, quem sabe,
(suprema ironia)
Um anjo torto saído das sombras
Os tenha levado a um outro
Mais errado que eu
E por isso mesmo mais poeta.
É possível até
Que meus versos mal rimados
Tenham ficado do outro lado do oceano
E que sirvam de dardos e capas
Para homens que toureiam
Em eternas cinco da tarde.
Quem sabe se minhas folhas rabiscadas
Caídas em alguma grama
Não tenham sido pisadas
Pelos rebanhos de algum guardador de ar.
Só sei que em meio a tantas letras,
Tantos verbos, pronomes e vocábulos,
Eu perdi todos os meus poemas
E só assim encontrei minha poesia.