quarta-feira, 29 de junho de 2011

Onírica creação

(um texto em prosa nascido de um sonho em verso)
            O cosmo se alargava sem limites ou definições; não havia começo nem fim nem meio. Só havia o todo e o Todo era.
            O Ser Luminoso fora atraído para o ponto diminuto, microscópico diante do infinito, mínimo e ao mesmo tempo tão importante quanto todo o resto, pois o cosmo infindo só existe pelos inumeráveis grãos espalhados pelo Altíssimo.
            Naquele ponto perdido no Todo, o Ser Luminoso se tornaria co-creador, seria o início e o fim.
            Começou por dominar os elementos agradecido à causa primária pela creação dos fundamentos formadores de tudo.
            Tudo era um grande sonho que de seu sono tornava-se realidade.
            E eram ao todo nove grandes e um número incontável de mínimos dentro do mínimo. Tudo pulsava ao redor de uma bela estrela quinta cuja luz e calor só eram relevantes para os próximos.
            Cada um dos nove grandes recebera sua destinação; cada um teria um significado; cada um uma escola para diferentes classes que teriam um só professor.
            Meteoros vinham de longínquas distâncias, vencendo as eras, trazendo as sementes da vida, veículo daqueles que caminham para a luz.
            No espaço um eco foi entendido como “Que se faça...” e o amor se fez verbo e o verbo se fez carne e o filho se fez Pai.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Mina de nação

De onde se tira ouro,
De onde se colhe prata,
Fonte de diamantes e esmeraldas
Onde os mortais buscam enriquecimento,
Tesouros de saber
Com sabor de palavras
Brilhos multicores
Do carinho de mãe eterna e terna.
Quero a riqueza que só encontro nesta mina,
Mina de amor,
Mina de luz,
Jorra em gotas,
Gotejo que encharca,
Mina das mãos de Jesus.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Intermezzo

Sou o que fica no meio do caminho
À espera dos que vem e vão.
Sem me encontrar em nenhum dos que partiram
Me reconheço em cada destinatário das vozes.

Sou o próprio meio do caminho
Ligando dimensões conexas,
Vibrando naquela e agindo nesta,
Revelando, relembrando, religando.

Sendo meio de caminho,
Ou seguindo o caminho do meio,
Tenho de apreender a essência
Para aprender na existência
O que me está na consciência.

É preciso fazer um curso,
Traçar um rumo,
Não ser a pedra-obstáculo,
Para transmitir a eternidade
E a certeza que encurta distância
E ameniza a saudade.

Levando aos que esperam
O alento dos que foram,
Não tenho tempo de sentir
A ausência que em mim lateja,
E o consolo que me falta
É suprido pelo que espalho.

Meio-do-caminho-mãos.
Meio-do-caminho-voz.
Meio-do-caminho-imagem-e-som.
Meio-do-caminho-eu-inteiro-e-múltiplo.

E se hoje sou meio,
Serei mais tarde origem
E, quem sabe, destino
A que levará outro meio de caminho.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Enquanto Clara dormia - Tarde de Autógrafos

Algumas imagens da tarde de autógrafos que marcou o lançamento oficial do livro "Enquanto Clara dormia", realizada em 04/06/2011, no Espaço Cultural Sylvio Monteiro, em Nova Iguaçu-RJ

 Dando as boas vindas aos convidados

 O autor do prefácio, o poeta João Prado

 Lorena Varela - uma nova geração de declamadores

 O jovem poeta Luiz Guilherme

 Ana Lídia, poeta e declamadora

 Jorgina Oliveira, declamadora

 Minhas três musas ou uma família repleta de poesia


 Cliques autográficos

 Clara acordada (ou quase)

quarta-feira, 1 de junho de 2011

AGONIA E ÊXTASE: NOSSA LITERATURA EM “UM HOMEM CÉLEBRE”, DE MACHADO DE ASSIS

Tomarei o projeto literário de Machado de Assis, considerando-o como elemento formador de uma literatura nacional efetivamente forte, capaz de dialogar com a produção européia e/ou clássica, mas sem a preocupação de copiar-lhe o estilo nem tão pouco preocupado em apresentar uma cor local na escrita. Para tanto, valer-me-ei de uma análise muito pessoal do conto “Um homem célebre”, publicado em Várias Histórias. O conto serve ao mesmo tempo de alegoria para o novo papel do artista em uma sociedade voltada para o mercado de consumo e para a construção da obra de arte enquanto representante da nação. Como o primeiro aspecto já foi amplamente estudado por outros autores como Henriqueta do Coutto Prado Valladares, focarei minha análise no segundo.
Ao apresentar-nos o drama do personagem Pestana, famoso compositor de polcas que guarda o desejo secreto de igualar-se aos grandes mestres da música universal, Machado toca fundo naquilo que foi possivelmente o grande mote de toda a produção literária e artística no Brasil desde a implantação do Romantismo e que permaneceria no centro das manifestações literárias do próprio Modernismo no início do século XX: a criação de uma obra de arte genuinamente brasileira que retratasse a nossa cultura embora fosse constantemente permeada por uma expressa necessidade de igualar-se com a produção estrangeira, fonte dos chamados “mestres” nas diversas áreas.
Isso fica bem demonstrado quando Pestana, ao retornar a casa após um sarau familiar em casa da viúva Camargo, senta-se ao piano e encara seus mestres retratados e chamados pelo narrador de “compositores clássicos, Cimarosa, Mozart, Beethoven, Gluck, Bach, Schumann, e ainda outros três,” (1975: 87) que constituem para o compositor brasileiro seu grande deleite e ao mesmo tempo extremo martírio. O deleite de poder interpretar-lhes as obras e o martírio de sentir-se impulsionado à criação de uma obra musical capaz de ombrear-se com a de seus mestres, que lhe desse a imortalidade derivada do reconhecimento da grandeza de que seria capaz o seu gênio criador.
Entretanto, não se pode reduzir o conto em questão ao simples drama do personagem central, isto só seria possível ignorando o que diz Luiz Costa Lima em seu ensaio “O palimpsesto de Itaguaí”, embora um tanto longa a citação se faz necessária:
Ocorre-nos uma hipótese: Machado foi um criador de palimpsestos. Como informam os dicionários, o palimpsesto era um pergaminho, cuja primeira escrita muitas vezes era rasurada para que uma segunda se depusesse sobre as letras apagadas; a curiosidade dos analistas era então mobilizada para recuperar o texto primitivo. Supomos então haver em Machado uma verdadeira política do texto consistente em compor um texto aparente, “segundo”, capaz de interessar a seus leitores “cultos” pelo sóbrio casticismo da linguagem, seus polidos torneios, suas personagens de pequenos vícios e inofensiva aparência. Sob esses traços, eram deixadas as marcas de um texto “primeiro”, que a impressão tipográfica antes velava que apagava. (1991: 253)
O que se esconderia, portanto, sob a camada do texto “segundo”, ou como eu prefiro dizer “aparente”, que conhecemos sob o título de “Um homem célebre”? Deixemos de lado maiores considerações sobre a história aparente, i.e., a criação artística enquanto elemento nascente do talento e da inspiração, e nos forcemos por trazer à tona o texto “primeiro” que ali se encontra semi-oculto para o leitor. Começarei por enfocar o papel do artista como representante e criador de sua própria cultura.
Foi no Romantismo que surgiu pela primeira vez a proposta de criação de uma literatura brasileira, que retratasse nossa terra, nosso povo e nosso ethos de forma plena e capaz de ombrear-se com o que era produzido na Europa. Nesta busca cultural, cujos grandes representantes da primeira hora foram nomes como Gonçalves Dias e José de Alencar, os modelos europeus foram amplamente explorados gerando uma literatura que, embora fosse permeada de uma certa cor local, foi incapaz de retratar nossa realidade de maneira efetivamente real, i.e., toda a nossa produção literária era em verdade uma grande idealização de nossa cultura e história a fim de buscar a aprovação da arte produzida alhures.
Pestana seria, portanto, uma metáfora de nossa mentalidade sempre preocupada em encontrar um lugar de destaque na metrópole cultural, o que pode ser conferido nas palavras do narrador do conto ao dizer que sua fama “dera-lhe definitivamente o primeiro lugar entre os compositores de polcas; mas o primeiro lugar da aldeia não contentava a este César, que continuava a preferir-lhe, não o segundo, mas o centésimo em Roma” (1975 [1896]: 94).
Machado demonstra sua virtuosidade ao utilizar a música em lugar da literatura e se nos torna relativamente simples entender que tais referências se apresentam ao leitor de forma mais evidente do que se poderia supor. De fato, o início do conto é por si só emblemático quando levamos em conta que os saraus, ou salões, tão em moda no século XIX eram encontros amplamente disputados pelos poetas e demais artífices da palavra de então, como bem demonstrou Ubiratan Machado em sua pesquisa intitulada Vida literária no Brasil durante o Romantismo.
A dicotomia entre popular e erudito fica bem clara quando as polcas de Pestana chegam “à consagração do assobio e da cantarola noturna” (1975: 86) da mesma maneira que um escritor popular vê-se citado e declamado aqui e ali pela cidade. O desagrado que isto provoca em Pestana, pensando-o como metáfora do escritor, poderia nos dar a falsa idéia de que escritores não se desejam ver nas rodas de conversa, nas esquinas, comentados, repetidos e até mesmo corrompidos quando seus textos não são devidamente citados (“e zangava-se quando não a tocavam bem” (90)). Em realidade, tudo isto fazia e faz parte da vida literária, mas a ironia machadiana busca atingir aquilo que mais atormenta qualquer artista: o sentimento de inferioridade. Lembro-me das palavras de um professor de artes para seus alunos ao se referir aos artistas brasileiros que buscavam a projeção internacional: uma vez tupiniquim, sempre tupiniquim.
É esta a primeira camada real do palimpsesto em análise: o artista local ao busca a consagração não é capaz de enxergá-la dentro de sua própria terra, como se só fosse um artista de talento e valor caso alcançasse o reconhecimento do e no estrangeiro. As polcas do compositor do conto são o que de melhor se produz em terra brasileira; Pestana, no entanto, deseja criar uma obra original seguindo o modelo de seus mestres (todos europeus); não é capaz de perceber-se como já estando a criar uma obra imortal seguindo um modelo que não é original de sua pátria(Segundo informações a Polca originou-se na região da Boêmia, no Império Austríaco).
Machado aponta, assim, para o problema daquilo que mais de um século depois seria chamado por Costa Lima de “dependência cultural”, uma dependência que está longe de ser de caráter exclusivamente econômico, senão pela “decorrência dos próprios valores com que julgamos a atividade intelectual” (1991: 270) bem como a atividade artística que se vêem constantemente impelidas à aprovação de qualquer que seja o intelectual estrangeiro, de preferência o com várias obras no currículo.
Visto sob tal ótica, portanto, a agonia do personagem Pestana sofre um duplo desdobramento: em primeira instância será a representação do drama pessoal vivido por cada artista que “isolado na poltrona de sua melancolia”, como diria Fernando Pessoa, busca constantemente aquela obra que lhe dará “o primeiro lugar entre os homens”,nas palavras do defunto Brás Cubas.
Em segunda instância Pestana, como já dito anteriormente é a metaforização de toda a produção literária praticada no Brasil de então, sendo uma visão assustadoramente atual, de nossa mentalidade tupiniquim sempre em busca da aprovação de uma metrópole a que atribuímos algum tipo de superioridade difícil de ser explicada e entendida quando nos debruçamos detidamente sobre o conceito que lhe emprestamos.
Toda a criação literária brasileira segue por uma destas duas vertentes: a agonia de buscar reconhecimento por aqueles a quem tomamos como mestres e modelos e o êxtase decorrente de quando uma obra brota do cérebro já pronta, bela, completa e por si só perfeita e eterna.
Concluímos, portanto, que Machado apresenta neste conto, bem como em outras de suas obras, plena consciência de seu trabalho como gerador de uma grande obra que reflita, a partir de dramas aparentemente banais, a complexidade do espírito humano, de criador de uma obra que, longe de buscar a aprovação dos mestres, dialoga com estes e os supera. Se o primeiro lugar na aldeia era incapaz de satisfazer ao ambicioso compositor de polcas, nenhum lugar em Roma é capaz de dar conta do real valor do criador genial que foi o Bruxo do Cosme Velho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSIS, Machado de. “Um Homem Célebre”. In: _________. Várias histórias. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1975 [1896], p. 85-94.
COSTA LIMA, Luiz. “Dependência Cultural e Estudos Literários”. In: _________. Pensando nos trópicos (Dispersa demanda II). Rio de Janeiro: Rocco, 1991. p. 266-78.
___________. “O palimpsesto de Itaguaí”. In: _________. Op cit. p. 253-65.
MACHADO, Ubiratan. Vida literária no Brasil durante o Romantismo. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001.
PRADO VALLADARES, Henriqueta do Coutto. “Várias histórias em ‘Um Homem Célebre’”. In.: DIAS ROCHA, Fátima Cristina (org.). Cenas do discurso: deslocamentos e transformações. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006. p. 67-82.