sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Tempos de saber-se



No tempo em que eu era velho
olhava meu país com desprezo;
pensava no passado dos outros
enaltecidos por grandes nomes
e julgava menos a minha própria história:
povos antigos nos legaram mitos fantásticos
dos quais eu desejava ter sido herdeiro,
ter dançado com a lira de Apolo,
me embriagado nas festas de Baco,
ter visto o martelo de Thor cruzar os ares,
ter galhofado com Loki.
Queria a filosofia
dos sábios que andaram na terra.
Queria as honras, as glórias,
das batalhas de céus e mares.

Depois, quando me fiz moço adulto,
vi meu país me chegando
na tela colorida do aparelho
que ganhava ainda mais cor
pela nossa multiplicidade.
E foi então que me apercebi
como um Cabral tardio
descobrindo uma nova nação,
cheia de brilhos, de vida,
com cantos encantadores,
com tantas vozes e letras
que me fez ter entendimento
de que somos muitos num só
e que temos de herança
o tesouro do mundo todo
e que enquanto os demais louvam
valorosos guerreiros das armas,
aqui podemos cantar sem pejo
os lutadores da fé e da paz.
Temos sábios sem fama
com valor sem igual:
Dulces, Anchietas, Damiões,
Xavieres, Câmaras, Joaquins e Josés,
e tantos ainda anônimos
que espalham e espelham alegria e amor.

Foi daí que me tornei menino,
pleno de maturidade,
e vou saindo pelas estradas,
vou pisando na minha terra,
vou provando do meu chão,
abraçar esse meu povo
sem preconceito,
sem medo,
sem vergonha
e sentir o aroma doce
dos cerrados,
das caatingas,
das atlânticas,
das chapadas,
misturar o meu trabalho
que me escorre pela pele
com a música que transpiro.

Haverá quem se ria de mim
e me julgue ingênuo ufano,
a estes eu digo e afirmo
que não fecho os olhos
pras mazelas dos desmazelados,
nem sou surdo aos protestos
que se erguem contra os que
corrompem no sagrado ofício do
apontamento dos rumos dessa nação.

Eu sei de tudo isso,
eu sofro o mesmo sofrer
de meus irmãos de chão,
mas eu digo, seu moço,
que não é pelo que vai mal
que deixo ou deixarei de amar esse torrão,
e que não é o defeito presente que me encanta.
O que me empolga, seu moço,
é a árvore na semente,
é o fruto futuro,
é o sonho que se faz
a cada dia
desse país,
minha casa,
minha terra,
meu tesouro,
minha emoção.
Glaucio Cardoso
2012

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