quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Peleja no céu

Contam que em terras distantes,
Do outro lado do dia,
Seus pássaros habitantes
Viviam em paz e harmonia.

Haviam abandonado o solo
Em tempos já esquecidos,
Ganhando os céus de Apolo
E horizontes desconhecidos.

Mas eis que os teutônicos Falcões,
Seguindo de um deles a ambição,
Declararam guerra às nações
Provocando caos e destruição.

Com suas garras afiadas
E de bicos recurvados,
Agridem aves assustadas,
Tornam pássaros escravizados.

Ao mundo trazem matança,
Na Polônia começam a desgraça,
Combatem no céu da França,
Se julgam superior raça.

Prosseguem sua trajetória
Com asseclas de voz presente
Na bota que é berço da história
E na terra do sol nascente.

E o falcão louco grita e berra
E o Canal da Mancha atravessa,
Mas nos céus da Inglaterra
Encontra diferente conversa.

Em tempos de luto e pranto,
De lágrimas e gritos roucos,
Nunca tantos deveram tanto
A tão raros e tão poucos.

A batalha cruza os ares,
Não há ave que não a veja,
E as Águias atravessam os mares
Pra também entrar na peleja.

Um certo tipo de penas
Olhava a luta aguerrida
Só reparando nas cenas,
Mas doido pra entrar na briga.

Pernalta de longo pescoço
Com boa e perfeita visão,
Pronto pra qualquer esforço
Sem esconder cabeça no chão.

Mas voltemos à dura batalha
Que arrasta todo o mundo,
De sangue os mares coalha,
Fazendo o solo infecundo.

Guerra insana, treva imensa;
Irmão a irmão se matando;
Tanto caos, fumaça densa
Em espirais nos céus voluteando.

No meio da comoção geral
Pombas brancas socorrem os feridos,
É a Cruz Vermelha Internacional
Levando alívio aos sofridos.

A peleja chegou a um estado
De quase total estagnação,
O sonho de paz malogrado
Pedia urgente solução.

Os pernaltas nesse instante
Resolveram mostrar suas garras
Como um trovão tronituante,
Como um raio que não tem amarras.

Vieram cruzando os ares,
Pareciam velozes cruzes,
Para alívio dos pesares
Lá no alto os Avestruzes.

“Alto lá amigo poeta
Me perdoe a intromissão,
Mas pra história ser completa
É preciso uma explicação.

Esclareça melhor o verso,
Fale reto, sem complicar,
Pois já vi de tudo no universo,
Mas nunca vi Avestruz voar.

Olhe que já vi coisas de espantar:
Saci, Curupira, assombração,
Político honesto, mesa girando no ar,
Mas Avestruz voando, não.”

Pois deixe, amigo, que te diga,
É justa e certa a indagação.
Basta lembrar a lei antiga
Que diz ser inevitável a evolução.

As baleias dominaram continentes
E hoje são gigantes dos oceanos;
Os outrora símios inocentes
Chegaram a seres humanos.

As galinhas dos quintais,
Dos dinossauros descendentes,
E das sopas primordiais
Somos todos remanescentes.

E por isso é que é natural
Que diante da necessidade
O Avestruz, ave descomunal,
Voasse a toda velocidade.

Avestruz Nero era o comandante
Dos melhores que havia na raça,
Sob seu comando surge triunfante
O Primeiro Grupo de Caça.

De quepe branco altaneiro,
Destaque no céu vermelho da guerra,
Tendo por escudo o Cruzeiro
Pra honrar o nome de sua terra.

Um olhar feroz e valente,
Trabuco poderoso e certeiro,
Não houve nenhum combatente
Como o Avestruz majestoso e guerreiro.

No meio da guerra crua
Eu tenho de mim para comigo
Que só o grito “Senta a Pua!”
Já fazia tremer o inimigo.

A contenda seu preço cobra,
Antes e durante o combate,
Falta ave, coragem sobra
E o grupo não se abate.

Regaram com sangue aquela terra,
Destruindo adversário audaz
Para que a erva daninha da guerra
Desse lugar ao jardim da paz.

Não havia facilidades
No ar ou mesmo no chão,
Mas venceram adversidades
No cumprimento da missão.

No peito as saudades de casa,
Da guerra o fastio, o cansaço.
No ar um amigo ao alcance da asa,
Um irmão ao alcance do braço.

Não há mal que sempre dure,
Assim diz o velho ditado;
Não há dor que não se cure,
Tudo tende ao normal estado.

Foi decerto o que se pensou
Quando em meio à destruição
A guerra enfim terminou,
Grande e incabida foi a emoção

E da memória não se pode remover,
O tempo só aumenta a pujança
De se ouvir “the war is over”,
Acabara a infame matança.

Cada ave foi pro seu lado,
Um mundo a reconstruir,
Ficou importante aprendizado
A ser passado para o porvir.

Os Avestruzes cobertos de glória,
Para casa retornaram
E no correr dos anos da história
À eternidade passaram.

Seu exemplo sem igual
Serve a homens e meninos;
Já tem Avestruz Virtual
E Avestruzes Femininos.

A paz é o melhor sextante,
Assim me disse o Avestruz Rui,
Exemplo de disciplina constante
Ao menino que já fui.

Mas se para essa paz defender
For precisa a luta varonil,
Teremos a nos defender
Os Avestruzes do Brasil.
Uma homenagem aos bravos pilotos brasileiros que lutaram nos céus da Itália entre 1944 e 1945.
A todos eles meu mais profundo respeito e agradecimento.

Um comentário:

  1. Gláucio, o poema é sensacional! Se eu falar mais estraga! Parabéns, meu caro!
    Thales de Oliveira

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