quarta-feira, 9 de maio de 2012

Ainda a poesia


     A poesia tem sido uma das principais formas de expressão da Literatura. Em todos os tempos, em toda parte, em qualquer cultura, lá está a expressão poética.
     Passam-se as eras e o interesse por tal matéria permanece vivo. Mesmo na atualidade, nessa época de Internet e tecnologia, vemos como o ser humano ainda se volta para os versos e as imagens poéticas. Exemplo disso é a enormidade de sites, blogs, comunidades virtuais que se multiplicam na rede. Sem esquecer dos eventos literários que têm se tornado mais e mais comuns (felizmente) nas grandes e pequenas cidades.
     Mas afinal de contas, por que tanto interesse em algo [aparentemente] tão comum? Vejamos a palavra do crítico e professor Ítalo Moriconi:
     Para a tribo dos leitores, a poesia traz sobretudo promessa de prazer. É gostoso ler poesia. Para alguns, é até mais gostoso que ler romance. Por certo, é mais gostoso que filosofia. Poesia respira, joga com pausas, alterna silêncios e frases (os versos). Poesia é bonito na página, é festa tipográfica. Festa para os olhos. Ritmo visual que vira sonoro, quando lemos o poema em voz alta. Imaginação e sabedoria combinadas numa certa vertigem, a velocidade das estrofes. Linguagem concentrada que, no entanto, pode distender-se, estender-se. Todos os cinco sentidos traduzidos, por meio da palavra, em coisa mental. Coisa mental que se pode comunicar pela fala, guardar na página ou na memória, que nem talismã.* (grifos meus)
     Acredito que o que o eminente professor procura demonstrar é, em outras palavras, que o ser humano sente verdadeira necessidade da poesia. E que a poesia, por sua vez, tem a facilidade de arrebatar aqueles que se predispõem a parar um pouco e lê-la ou escutá-la.
     Vai aqui um depoimento pessoal: eu tinha meus 8 anos de idade quando fui a um evento filantrópico com meus pais. Não me lembro direito do que foi mostrado naquele encontro, mas me lembro de um senhor moreno, cabelos grisalhos e jeito simples ser chamado ao tablado (havia algumas mostras artísticas); ele cumprimentou o público, agradeceu a presença de todos e começou a falar de uma forma que u nunca tinha visto antes. As palavras saíam de sua boca num ritmo que parecia música, mas não havia nenhum instrumento musical sendo tocado, seguindo numa cadência encantadora.
     Eu estava deslumbrado! Aquilo que eu ouvia me despertara da sonolência natural em uma criança de 8 anos que vai a um evento para adultos. As palavras fluíam e eu me sentia arrastado pelas águas bravias e ao mesmo tempo aconchegantes de um rio que parecia correr pelos meus ouvidos e que logo me envolvia por inteiro. Nem percebi quando acabou e me lembro de ter ficado com as mãos doendo de tanto aplaudir àquele senhor que depois se sentou e ficou muito quietinho. Ele voltara para seu lugar, mas eu ainda o olhava de longe, espantado...
     No caminho de volta, lembro de ter tido uma conversa com meu pai que foi mais ou menos assim:
     – Pai, o que era aquilo que aquele moço tava falando lá no palquinho?
     – Aquilo, meu filho, se chama poesia. Ele estava declamando poesia.
     Nesse dia nasceu uma paixão em mim: pela poesia! Uma paixão que se estendeu ao poeta que conheci naquele dia, João Prado. Uma paixão que me acompanhou pela infância e adolescência e que foi fundamental na escolha de minha profissão. Paixão que procuro transmitir aos meus alunos no dia a dia da sala de aula.
     Acredito que a poesia e os poetas são detentores dessa capacidade de despertar a paixão nas pessoas. O gosto e o amor pela vida. O encantamento pela existência e por tudo o que existe no mundo.
     Eu sei que existem aqueles poetas que traduzem em versos as angústias humanas, mas mesmo esses acabam por legar aos leitores páginas ricas de paixão poética.
     Não temos como prever que tipo de poesia teremos daqui para adiante, mas acho pouco provável que a poesia deixe de existir e de encantar os homens. Afinal, o ser humano tem necessidade de paixão.

MORICONI, Ítalo. Como e por que ler a poesia brasileira do século XX. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.

Um comentário:

  1. Excelente apologia da poesia. Sempre afiadíssimo com as palavras, esse meu amigo Gláucio. Tomo a liberdade de contribuir singelamente com a defesa de algo tão nobre. Meu argumento é: para além de todos os bens que a poesia possa trazer para o nosso espírito, nenhum deles pode ofuscar este: a poesia. Ela é um fim em si mesmo, ainda que possa transbordar para outros fins particulares, pois, ainda que a poesia nos desse apenas a si mesma, tal doação já seria suficiente para justificar sua sublime existência.

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