sexta-feira, 4 de setembro de 2015

O sono de um anjo




O anjo na areia
Parece dormir
Um sono cansado.

Queria vê-lo brincando,
Queria vê-lo sorrindo,
Queria vê-lo em seu prometido voo.
Mas o anjo não acorda,
Não brinca,
Não voa.

Quem cortou tuas asas?
Quem foi que apagou os rastros de teus passos?
Quem foi que fez calar teu riso?

Eu digo e afirmo
Que fomos todos nós;
Os olhos cerrados,
Os braços cruzados,
Todos fechados
Para quem só queria o refúgio
De um carinho sincero.

Será que as fronteiras
Que existem nos mapas
Se tornaram muralhas
Que separam os homens?
Por que é tão difícil
Abrirmos o peito
Pra dar abrigo
Ao outro que sofre?

Eu queria poder, meu anjinho,
Te tomar em meus braços
E cantar pra você canções de acordar,
E sussurrar coisas belas
Pro teu doce sonhar.

Mas o anjinho não vai acordar,
Nós condenamos, a ele e a outros,
A um aparente dormir.

Eu sei te dizer, meu anjinho,
Que nunca vou te esquecer,
Pois senão eu estaria
Esquecendo de mim
E de quem você é:
Você é nossas crianças,
Você é nosso futuro,
Você é a dívida
Que nos acompanha
E que é preciso saldar.
Você será sempre criança
Em nossas retinas.

Agora vá, meu anjinho.
Sobe bem alto até as estrelas
E conta pra elas as tuas histórias,
A que devia ter sido e a que fizeram ser.
Vai correr entre as nuvens
E cantar entre os pássaros,
Vai rir um riso solto no meio do azul.

Só te peço, anjinho,
Que perdoes aos homens
E que se puderes,
Em tua oração,
Meu anjo,
Sonha por nós.
Glaucio Cardoso
03/09/15

Em memória de Aylan Kurdi, menino sírio morto aos três anos de idade quando buscava refúgio de uma guerra que não era dele.

 

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