sexta-feira, 13 de julho de 2012

God save the Queen!


Deixe-me esclarecer duas coisas. Primeiro: adoro ler biografias, principalmente de artistas. Escritores, pintores, músicos, atores. Segundo: estou falando de artistas que realmente deixaram sua marca no mundo mediante uma trajetória efetivamente relevante, não estas biografia escritas a toque de caixa para aproveitar os fenômenos construídos pela mídia. Dito isto convido-os a algumas reflexões sobre uma biografia que li recentemente.
            Considero a escrita biográfica um risco imenso. De um lado fica sempre a sensação (creio eu) de que não se disse tudo, afinal a vida de uma pessoa não cabe toda inteira em umas folhas de papel, não importa a quantidade destas. De outro, o biógrafo pode terminar por ser condescendente com o biografado, envolvendo-o numa aura de santidade, fechando os olhos para suas deficiências tão típicas do humano ou mitificando-o além da medida.
            Felizmente isto não ocorre em Freddie Mercury, biografia do líder (e por que não dizer alma) da banda inglesa Queen, escrita pelo francês Selim Rauer.
            Sem aparentar a pretensão de ser a biografia definitiva sobre um dos mais emblemáticos artistas da história do rock, o texto de Rauer mostra-se competente ao nos apresentar o homem por trás do ídolo, levando o leitor a uma viagem no tempo e no espaço.
            Somos apresentados ao jovem persa Farrokh Bulsara, nascido em 5 de setembro de 1946 na ilha de Zanzibar, costa africana, e à uma trajetória de vida que o fez transformar-se em um astro.
            “Freddie Mercury provavelmente foi o sonho de Farrokh Bulsara”, assinala Rauer logo no capítulo 1, no qual temos alguns flashes de uma infância ocultado com cuidado e carinho como se fosse um tesouro reservado a poucos. E o que sonhava este homem? Sonhava com a glória, com o palco, com a vida diante do mundo.
            É este sonho que nos é apresentado em boa parte do livro, com suas tentativas, experimentações, quedas, sucessos, fracassos. E também com pesadelos. Pesadelos criados pela própria complexidade do biografado. Mercury é retratado por Rauer como capaz de grandes demonstrações de sensibilidade e também de tirania, como um ser altamente criativo que se permitiu abusos de todo tipo, como uma alma inquieta que buscava algo que nem mesmo o biógrafo ousa arriscar o que seria.
            Se Mercury foi o sonho de Bulsara, paradoxalmente aquele sonhava com uma vida familiar que foi negada a este. No fim, vemos um ser humano frágil, desejoso da tranquilidade de um lar com alguém amado.
            Um outro risco das biografias é isolar a figura retratada, como se fosse alguém apartado de seu tempo. Este é um outro mérito do livro de Rauer, pois nos apresenta a história de Freddie Mercury e do Queen em paralelo com a própria história do rock e (em parte) da música ocidental nas décadas de 70 e 80. Também temos um breve panorama do impacto que o surgimento da AIDS causou na sociedade como um todo e na comunidade homossexual da época, temática esta que é trabalhada com rigor histórico e respeito.
            Um grande trunfo do texto de Rauer, pelo menos na minha percepção, foi conseguir fazer com que me sentisse transportado aos último momentos do cantor, levando-me às lágrimas como se seu desenlace, ocorrido em 24 de novembro de 1991, estivesse acontecendo no exato momento da leitura. Poucas vezes vejo biógrafos tão competentes neste mister.
            Como se não bastasse, o livro é ainda complementado com uma discografia completa do Queen e dos trabalho solos de Mercury, um presente para os fãs, e ainda possui índice onomástico que muito auxilia em pesquisas posteriores.
            Quer você seja fã da banda, quer você aprecie o rock, a leitura te será satisfatória. Se você não se enquadra em nenhum dos casos, ainda assim poderá apreciar um verdadeiro passei pela alma deste artista.
            Que o show continue.





Freddie Mercury
Autor: Selim Rauer
Ed. Planeta
Trad. de Marly N. Peres
2010
319 páginas

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